terça-feira, 30 de junho de 2009

Hermético

Desenhado por Luágata



Se tudo é um gigantesco espetáculo e o homem nunca pisou na lua, à deriva, vou sendo o que sou. Amante da vida, falso modesto, humano. Hermetismos: só os pascoais e os natalinos. O infame e distante mistério familiar. Aconchegante e arriscado. De repente, tudo vira, num instante, de pernas, para o ar. Não necessariamente nesta ordem. É preciso esperar tudo se assentar. A bagunça se organizar dentro e fora da gente. A vida não tem coerência, nem coesão textual. Não é econômica como um filme americano. A vida é um exagero de sonhos, de sentimentos, de medos. Na ‘vida real’ as pessoas dão duas voltas na chave para protegerem-se de si mesmas. Portas, chaves, cadeados. Não se preocupe: “o que é seu está guardado”. É cada um no seu quadrado, cuidando do seu redondo. É um absurdo.



Ariel
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domingo, 28 de junho de 2009

Omelete

Abriu a porta da kitnet, cansado e louco, por um banho. Vive feliz na sua caixa de fósforos, com seus quadros baratos e reproduções de obras famosas. Vive feliz com suas flores artificiais e seu peixe beta. Gabriel não tem culpa dessa vidinha besta, e, o condomínio não aceita gatos. É assim que as coisas são hoje em dia. Discos, filmes e livros recheiam a sua vida. O notebook é somente necessário, como um automóvel ou um liquidificador. Jamais uma paixão. As paixões não tem explicação. Gabriel desconfia sempre das pessoas que não tem paixões. No seu quadrado, ele pensa, dança, canta, chora... Gosta de filosofar, fumar um, tocar violão, ouvir Madonna e Bowie com seus amigos, e, festejar, sabe lá o quê. Gabriel é um pouco egocêntrico, é verdade, mas é alegre e bonito, por isso desperta a inveja de meia dúzia. Mas ninguém inveja a sua máquina de escrever Olivetti. O que a meia dúzia não suporta é a sua alegria sem razão, o seu jeito bobo de falar e displicente de se vestir. No Brasil, qualquer pessoa que tenha vários talentos não é bem vista. Porém, ele sabe que não é o Chico Buarque, nem a Maitê Proença. Gabriel simplesmente é. E só tem certeza de duas coisas na vida: que é um cara legal e que faz o melhor omelete do mundo.

Ariel



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Genial.






















sexta-feira, 26 de junho de 2009

Luto

foi pobre, foi rico, foi preto, foi branco, foi homem, foi mulher

nunca foi criança, nunca foi feliz

mas foi o cara



http://www.youtube.com/watch?v=33TWf2i2Rws



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"A música de Michael viverá para sempre." - Madonna


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quinta-feira, 25 de junho de 2009

neoliberal















(...)

o neoliberal
sonha um admirável
mundo fixo
de argentários e multinacionais
terratenentes terrapotentes coronéis políticos
milenaristas (cooptados) do perpétuo
status quo:
um mundo privé
palácio de cristal
à prova de balas:
bunker blau
durando para sempre - festa estática
(ainda que sustente sobre fictas
palafitas
e estas sobre uma lata
de lixo)


haroldo de campos


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A Língua do Sol

Seus beijos tem versos. Falam minha língua. Acreditam na beleza dos mundos e das vidas. Recordações soltas no sol, palavras cheias de sol. E o mesmo sol que brilha aqui, brilha em Berlim. O mesmo deus que tá aqui, tá na China. O mesmo sol, o mesmo deus. O mesmo menino soltando pipa. Pomba, serpente, porco. Nunca se sabe tudo. Mas há momentos que achamos que sim. Porque nesse momento, nada mais nos cabe na alma. Naquilo que nos faz humanos – loucos e sábios – através do tempo. Puros como a luz.

Ariel

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Carro Humano

Sophia

Sophia é a palavra grega para sabedoria. E desenvolver a sabedoria está diretamente relacionado com a reflexão, com a sensibilidade adquirida pela vivência diária, com a convivência entre diferentes. No dicionário, algumas palavras sinônimas de sabedoria são: prudência, moderação, sensatez, conhecimento justo das circunstâncias.

Vivemos tempos, principalmente nas grandes metrópoles, onde as pessoas se submetem a tantos afazeres, tempos em que a questão do ter é sempre posta em maior evidência, que as qualidades acima - sinônimas da palavra sabedoria - estão ficando raras. Qualidades que nós, os humanos, deveriamos honrar.

Infelizmente somos negligentes em muitas ocasiões, onde as qualidades acima são essenciais. Nos apressamos em pré julgar, em fazer leituras preconceituosas e distorcidas, justificando que não temos tempo para ouvir, para conviver, para nos relacionar, porque estamos sempre muito ocupados. Somos seres perdidos em nossas próprias construções sociais.

Falta-nos, quase sempre, a boa dose de sabedoria cotidiana. Justificando tudo pela famosa expressão "falta de tempo" estamos fazendo de nosso tempo um tempo mórbido, desprovido de sentido, de reflexão, de alegria, da convivência.

Sei que esta reflexão expressa meus sentimentos de hoje! Oxalá, próximas e próximas reflexões possam expressar sentidos e sentimentos menos tristes!


Blog da Branquinha
http://pensarassociarrecriar.blogspot.com/

terça-feira, 23 de junho de 2009

Relaxa!

Coração Xamã

A vida é energia!

Espalhada pela Grande Alma
como quem espalha sementes,
tomou as mais variadas formas.

Todos nós vivemos
das energias uns dos outros,
em trocas ou apropriações.
Todos os seres alimentam-se
da energia de outros seres.

A vida para manter-se viva
precisa da morte.
E a morte é apenas um veículo
nessa troca de energias.

Portanto, a morte
é companheira da vida e,
as duas, irmanadas,
lutam contra a não-vida.


Mário Scherer

domingo, 21 de junho de 2009

Cobra Cega

Na terceira troca de pele, livrei-me de velhos caprichos, engoli alguns sapos e matei, dentro de mim, certos tiranos homeopáticos. Transformei a gélida noite numa imensa pista de dança da Patagônia. A solitária manhã implacável em café filosófico, apático. Patológico? Na terceira troca de pele, percebe, tudo passou a ser muito intenso, demasiado, humano, e, às vezes, enfadonho. Mas pagou a pena perder a pele de cobra cega, criada, rato de laboratório, representando para ninguém um personagem patético do SBT. Na terceira troca de pele não quis mais ser patinho feio, nem falso cisne. As palavras, em algum momento, seduziram-me. Então, entre sorrisos e improvisos, passei a Ser. Sei lá o que isso quer dizer. Mas é bastante sonoro e isso basta. Só sinto que ser, basta. E, se pá, basta ser.

Ariel

Cassiopéia

Esticou o braço esquerdo e, um pouco irritado, desligou o rádio-relógio. O poster da Lucélia Santos na parede tinha pra ele o valor da Monalisa. Ajeitou o terno e as ombreiras em frente ao espelho. Aquele dia seria um dia como outro qualquer, em Cubatão ou Calcutá. Atravessou a cidade com seu Monza do ano em direção à fábrica de brinquedos eletrônicos onde trabalhava. A televisão era a nova igreja e as crianças o novo mercado consumidor dos anos 80. No toca-fitas do carro tocava Big in Japan e Cássio cheirava a sua carreira bem no centro de Campinas. Aquele dia foi um dia comum. Nada acontecia na vida de Cássio, enquanto tudo acontecia no mundo a passos largos e traiçoeiros. Um dia Cássio desapareceu junto com o Prince e o Pogobol. No ano do Monza, o Lula perdeu a eleição, o Lobão foi preso e muitos artistas morreram de AIDS. Foi mais ou menos assim. Que Deus Cronos me perdoe! Depois veio a Lambada, o Vanilla Ice derreteu, a inflação acabou, mas todos os meus amigos continuam procurando emprego.

Ariel

sexta-feira, 19 de junho de 2009

quinta-feira, 18 de junho de 2009

cereal killer

filtro são joão água
benzida na televisão
a vida é curta eu só
queria um pouco mais
de açúcar

cruel festivo angelical

mate-me de cócegas suba
nas minhas costas grite
o mais alto que quiser
mate-me de rir desça
do salto se puder seja

minha estrela essa noite
sem máscaras sem luz
de velas cem vezes
sim


Ariel

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Brasil-zil-zil!










quarta-feira, 17 de junho de 2009

o ginásio

(...)

o repetente do primeiro colegial
não sei da sua família
vestia quase sempre a mesma
blusa de lã azul macia
embora eu nunca a tenha tocado
aprendi mais sobre os dedos
da mão dele girando
a caneta também azul
do que qualquer matéria
daquele ano

ana guadalupe


http://welcomehomeroxy.blogspot.com/2009/06/ginasio.html

caio, mas levanto.

que eu não perca a capacidade de amar, de ver, de sentir.
que eu continue alerta.
que, se necessário, eu possa ter novamente o impulso do vôo no momento exato.
que eu não me perca, que eu não me fira, que não me firam, que eu não fira ninguém.
livra-me dos poços e dos becos de mim, Senhor.
que meus olhos saibam continuar se alargando sempre...

caio fernando abreu


http://www.frequenciaduvidosa.blogspot.com

Bowie

terça-feira, 16 de junho de 2009

Qual é o RAP?

“O direito senhorial de dar nomes vai tão longe, que nos permitiríamos conceber a própria origem da linguagem como expressão de poder dos senhores: eles dizem “isto é isto”, marcam cada coisa e acontecimento com um som, como que apropriando-se assim das coisas.”


Nietzsche
Genealogia da Moral

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Barbarella, Cravo e Canela

Bom pra caralho!

Eletrodoméstico

– Manso e mediano, caminho humilde em busca de luz e ar puro, da verdade definitiva e consoladora, intestinal e doméstica – mas de todos os eletrodomésticos que me relacionei até hoje, foi o liquidificador o mais encantador – talvez pela sua simplicidade de uso e valor simbólico – não se trata aqui de nenhum tipo de ‘fetiche cyberpunk’, um pouco fora de moda, mas sim um certo orgulho animal-humano civilizado de beber doze vitaminas essenciais e sentir o sabor de tudo ao mesmo tempo agora – oral, verbal – é neste e só neste momento que se revela o erotismo da coisa – em meus escritos enlatados = coisas, circulares e, pretensamente, bem costurados, revelam-se incertezas éticas e fascinações estéticas, vícios, ou melhor dizendo, ideologias – nascidas sempre de ressentimentos que, em uma análise mais calma, nem a mim pertencem de fato, na maior parte dos casos – por isso esqueço por um tempo as laminas e concentro-me nas vitaminas – esqueço as teses e as conclusões e concentro-me nas ‘ciências ocultas’ da arte – por algum tempo – e, entre tantas teorias que se fundem, se confundem e se anulam – entre tantos ‘ses’, fico com a beleza plástica e meditativa das palavras, talvez nelas residam algumas verdades – por algum tempo –


Ariel

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Mar de Rosas

Jogo com o tempo
Um jogo cego
O velho prego
Cada vez mais perto
Crises e credos
Impressões mal digeridas
Atrizes mal dirigidas
O jeito é riscar um fósforo
Espiar o horóscopo
Acender uma vela
Pra não se sentir uma peça
De um jogo de damas
À deriva
Entregue aos espinhos da vida
Os artistas têm licença divina
Como os anjos e os peixes

Ariel

quarta-feira, 10 de junho de 2009

terça-feira, 9 de junho de 2009

papo bacana

senta aí francisco vamos bater um papo bacana sem pontos nem vírgulas a vida é um risco e um risco nem sempre quer dizer francisco pode ser só um rabisco pode ser só um nabisco pode ser só ou acompanhado francisco a vida é boa demais para ser verdade viver a verdade é viver de verdade é viver no cisco do olho na chuva no cheiro de chegar em casa a chave na samambaia é viver francisco é viver vem comigo roubar palavras e sorrisos






















sábado, 6 de junho de 2009

sem ré

não se sinta só no sofá sinta só o sofá sol lá sem dó de si sinta o sol que há lá fora fafá só não si esqueça de si fafá não se esqueça de mim fafá não se esqueça do filtro solar e da minha caloi fafá sol não si esqueça de mi

A Noite

A noite gela e gera monstros e sombras, rumores e amores mal resolvidos, fotografias envelhecidas. Alice não sabia dançar. E eu, assim, não sabia dar o peixe nem ensinar a pescar. Alice vai ser estrela de cinema. Vai ficar pra sempre no céu com os diamantes. Um dia eu vou também, boneco pagão, fantoche, tomar um quentão na quermesse, atirar em patinhos amarelos. O frio da noite pede cama, carne, calor. Pede Alice, pede laços, lagos e luas. A noite pede aço, pede veludo. Pede maçã-do-amor.


sexta-feira, 5 de junho de 2009

Eu-Tu-Eles

Maria não tem ressaca moral. Gozosa de si, fez, na Lição do Sapo, um acordo suave nos Jardins da Quarta Dimensão. O estojo de metal reluzente escorrega da sua carteira, e, o barulho desencadeia o caos na classe. As penas voam e as gírias viram jargões, os jargões viram termos, os termos viram palavras e as palavras vão parar no Dicionário. Maria adora, Maria brilha. Maria prefere o lado de cá que ri e que chora e que dá bola fora. Maria (que belo nome), cheia de graça, recolhe a marmita cintilante, a grossa caneta de dez cores, e realiza, erótica, o sinal da cruz.

Ariel Pádua

terça-feira, 2 de junho de 2009

Peixes

A paz vive nos teus olhos, e eu, já moro neles, entre dentes, nas entrelinhas. Num mar de olhos verdes. Silêncio. Um gesto. Mil sorrisos num sorriso sereno, certo, exato. As mãos, o cigarro, os chicletes. Chego sempre antes, um pouco afobado, contemplativo, mas seguro da minha eterna liberdade refletida em tuas esmeraldas. Não é bem isso, verdade seja dita e sentida, é muito mais que isso. Intraduzível, impronunciável como as coisas sagradas. As palavras desmancham na boca, desnecessárias. É redundante, sim, é banal. É, acima de tudo, lindo.